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Destralhar

Destralhar

Sonhar com os pés assentes nos pés

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Foto por chuttersnap ( Unsplash )

 

Ontem estava a ler um romance e uma frase destacou-se, pelo contraste com o discurso dominante com que somos bombardeados/as, segundo o qual devemos tentar seguir os nossos sonhos, deixar o emprego e arriscar.

 

Não sei quanto a vós, mas quando leio estas mensagens, mais vezes me sinto derrotada que inspirada. É a o discurso dominante também é: não arriscas porque tens medo, porque não te empenhas, porque não és suficientemente bom/boa.

 

Para sua surpresa, também descobriu que era possível ser-se bom naquilo em que se tinha pouco interesse, tal como tinha sido possível ser-se mau em alguma coisa, fosse ela pintura ou poesia, pela qual a pessoa se interessasse muito.

 

E se, a nossa melhor versão é a de executar, da melhor forma possível, o trabalho que nos paga as contas, deixando as paixões para os momentos de lazer? 

 

E se, sacrificarmo-nos pelos outros, mantendo uma profissão banal mas estável é a nossa melhor versão? Já repararam que a generalidade dos processos de desenvolvimento pessoal raramente abordam como nos damos aos outros / as nossas responsabilidades para com os outros?

 

E finalmente, será que as nossas paixões, depois de monetizadas, continuarão a fazer-nos felizes? 

Um final de ano atribulado

As últimas semanas não têm sido fáceis, no que respeita à gestão do tempo e emoções. Um episódio na saúde da minha mãe, que culminou nas urgências do hospital, levaram-me a algumas conclusões difíceis:

 

- está a ser cada vez mais difícil conciliar a vida profissional e familiar; adiar tarefas deixa de ser uma opção, quando não sabes como será o dia de amanhã;

 

- não tenho força física para pegar na minha mãe e isso assusta-me;

 

-  é absurdo ir para o hospital com três carteiras: a minha, a dela a dos exames;

 

- para o hospital, a regra é vestuário confortável e o apresentável que se lixe;

 

- a minha casa precisa de ser destralhada.

Perdas

Sinto-me a perder referências. Primeiro foi Pedro Rolo Duarte, editor do primeiro jornal que comecei a comprar com o meu dinheiro - O Independente, a minha entrada para a idade adulta. 

 

Agora Zé Pedro, dos Xutos e Pontapés, que foi a minha casinha na adolescência.  

Para mim, o Zé Pedro sempre foi/será o Homem do Leme:

 

Sozinho na noite
um barco ruma para onde vai.
Uma luz no escuro brilha a direito
ofusca as demais.

 

E mais que uma onda, mais que uma maré...
Tentaram prendê-lo impor-lhe uma fé...
Mas, vogando à vontade, rompendo a saudade,
vai quem já nada teme, vai o homem do leme...

 

E uma vontade de rir nasce do fundo do ser.
E uma vontade de ir, correr o mundo e partir,
a vida é sempre a perder...

 

No fundo do mar
jazem os outros, os que lá ficaram.
Em dias cinzentos
descanso eterno lá encontraram.

 

E mais que uma onda, mais que uma maré...
Tentaram prendê-lo, impor-lhe uma fé...
Mas, vogando à vontade, rompendo a saudade,
vai quem já nada teme, vai o homem do leme...

 

E uma vontade de rir nasce do fundo do ser.
E uma vontade de ir, correr o mundo e partir,
a vida é sempre a perder...

 

No fundo horizonte
sopra o murmúrio para onde vai.
No fundo do tempo
foge o futuro, é tarde demais...

 

E uma vontade de rir nasce do fundo do ser.
E uma vontade de ir, correr o mundo e partir,
a vida é sempre a perder...

 

 

Em ambos os obituários, o profissional é apenas uma introdução para louvar a atitude para com a vida de cada um, a forma como marcaram as vidas de com quem eles privaram. 

 

Penso nisso com frequência, como guia das minhas acções. Quando morrer, como quero que se lembrem de mim?

 

Mulher a sério...

Um dia disseram-me que uma mulher a sério usa maquilhagem. Mas existem vários discursos semelhantes: mulher a sério gosta de carteiras, roupas, sapatos...

 

Eu não tenho qualquer problema com essas coisas, mas irrita-me solenemente a contínua associação do feminismo a um conjunto de acessórios descartáveis.

1 (1).png 

E assim vos deixo com a minha irritação da semana. 

 

Uma espécie de ponto de situação...


Acho que corro o risco de criar alguma controversa, mas aqui vai.

 

O Cláudio Franco, sem saber, acabou por me deixar a pensar nos conceitos e nas ligações entre destralhar, minimalismo, abrandar, simplificar.



 



Quando comecei o blog, optei pelo "destralhar" (todo o tipo de tralhas - coisas e mente), porque não me revia na estética do minimalismo.



 



Ainda esta manhã passava por um blog lindíssimo e lia sobre abrandar. Mas olho para esse blog e são só imagens com divisões imaculadas, brancas, esteticamente perfeitas, falam do campo como um local idílico e fim em si mesmo.



 



Eu não me revejo nesse mundo. A minha casa não é assim, a minha vida não é assim e o quintal cá em casa não é assim.



 



Mas sabem que mais? A vida de muitas dessas pessoas, que utilizam essas imagens, também não é.

 

 



Fiz um exercício: peguei uma linda imagem de um blog sobre simplificar/abrandar e pesquisei-a no google - 22 resultados. Os primeiros resultados foram de blogs sobre minimalismo/simplificar de língua portuguesa.



 



Por vezes, o minimalismo também é uma imagem que nos querem vender. O problema é ser como as modelos cujas imagens alteram digitalmente - são imagens irrealistas, que têm como consequência fazerem-nos sentir imperfeitas.

 

 



Para mim, destralhar é igual a retirar o excesso da minha vida, seja ele em coisas materiais, seja em pessoas tóxicas, seja em ocupações de tempo que não merecem o meu tempo. Neste momento, esse caminho parece-me ser o que preciso de fazer.

 

Não sou perfeita e este blog é tudo menos perfeito. Mas pelo menos posso dizer que é verdadeiro. 

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